sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Poema de Jamesson Buarque

Poema ascético que Jamesson Buarque escreveu mas é meu - como nunca mais serei
Os incorrigíveis devem visitar http://www.jamessonbuarque.blogspot.com/, como todo crente deve ir à meca!:

Com o pó das dores de meu povo
nas dores de meus pelos
pelo calendário que meu
É a história da gente toda
Das cidades das roças e das matas
Eu outonia alguns amores
Ou esta ausência de unhas
E um peso de ser solidão
Depois das covas dos cemitérios
Visitados entre os livros
Nestes olhos apenas vidro
morto entre meus dedos
Como fosse possível algum exílio

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Umas filosofias

Quando olho rodoviárias penso no viajante e só!
"De repente, todos nós, por obrigação, ansiamos
Uma vez, noutro mundo, sob tempestuosidades
Ainda que, por sobrepassos, no entanto e quase
Sob as penas, mesmo hesitantes, amedrontados
E convictos, o saber em riste, tenazes em mente
Com avidez, com cheio de dedos, ar incontinenti
Destituídos de pudor que controle toda a ordem
Arrazoando a um infinito absoluto inconsistente
Ignorando a salvaguarda de direitos de retornar
Ao acaso, puro à esmo, a torto e a direito, ao léo
Ansiamos, por obrigação, nós todos, de repente."
olho quando penso naquele que vai ao cemitério!

sábado, 14 de agosto de 2010

Poema infanticida II - Freud

Todo mundo sabe mesmo
É morrer
De medo
O que ninguém sabe mesmo é morrer
De erro
Eu remedo
É meu remédio
Sou médio e creio
Medíocre sou
Os remendos de renda
De mim
mendigam
digam-me
gamam-me Id
em memória
de minh'alma
A minha memória de mim
Ama:
é morrer
de erro
Amaro-me tanto à mão
M(e)( )ato-me (n)a( )marra
Tomo a rota, remo, meu sêmen em ti
se(-)men(-)te
Manto ma(u)( )terno sente mente
Morreremos somente
erraremos só(s) por caminhos
Macarronearemos pontes
Por mais erros, medos, eras
Camas e ninhos - meros
Mercadeiros precários - eros
Hão de estar
Indo a(r)rumo a mim
a men
te

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Etiqueta em despedidas

Há que se haja um novo olhar que se veja velho
E de olhar outros olhares tão velhos ensejando novos

É como genuíno visitar-se cemitérios
Gene de cemitério é o visitante que decide a hora de partir

É como por necessidade rondar rodoviárias
transeunte de bagagens é ironia de chãos autóctones

De cemitérios e rodoviárias nos despedimos
Com olhares irônicos de quem parte
Tão velhos, tão novos
Irônicos autóctones

[Como uma vez já dissera:
"A saudade são cidadãos voláteis"]

sábado, 10 de julho de 2010

Poema infanticida VII - Cicloprofanação

Quem me incomoda a esta hora?
Revolve-me a terra por cima
Ouço o bater de uma pá

As dores do movimento do céu
Começam a se rarefazer
Sou transportado de volta ao túmulo
Sinto o cheiro de rosas ressequidas
E um entorpededor formol

Que perdição!
O desassossego é do homem
E não há saída
Morrer ou viver
Aprendi a não querer nenhum
Me desenterrarão...

Acharam minha urna
Retiraram-me pela cabeça
Cortam a ferida em meu abdômen
Lavam o caixão que me envolve
Estão com os narizes cobertos
Mas riem...

Um infeliz me espalma as nádegas
Choro! (e que horror!) vivo!
Não pela dor, mas vai começar
De novo
...
Lá está ela, sorri e chora...
Sou obrigado a sugar seu peito
Me apaixono já!
O resto todos já sabem
Isto é morrer de novo
...
Aprender a não dizer.

Poema infanticida III - Ícaro

Não me deixe cair
Em mim
Não me deixe
Em mim
Me deixe
A tua mão é ave
E pousa em mim
Tua mão é pouso
Do meu voo e eu teu
Voo
E vou aonde pousa tua mão

De mão em não vou
Caindo aonde você deixa
Em mim
Pousa teu lábio em meu
Voo-beijo
Voamos
Voo-amamos

Quando quero paz
(que passarinho também quer)
pouso - pausa!
Mas é quando a tua mão
Me a(m)para paripassu
Não me deixa cair
Em meu pouso(,)(-)voo
Em mim e você não me deixa
E há tanto por voar que no pouso
voamos.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

eu doente do mundo doente

Agora é sério!
Temos sorte incrível de não merecer este mundo, esse mundo.
Há um mundo doente em nós, doentes do mundo. Conhecemos teorias, relações, e há ciúmes na nossa vontade de haver planetas mais inteligentes que nós. Ali, na contrapartida galáctica, também nos vemos tristes, sonâmbulos e macambúzios de uma torta agonia de não haver círculos.
Aí precipitamos por dores tão côncavas até lembrarmos o jogo fictício e nos perdoar. Isso vai curando nossa desnecessidade de existência, nossa carência de vazios e o abandono que é pura noção da solidão, o único algo que nos incita ao engodo que é a existência.
Vejo nítido o caos, perambulando por sua própria demanda criadora. É um demiurgo rebelde que debalde engendra instâncias de haver. Quando incita a clareza em seu seio e empreende o desequilíbrio, aí sentimos estados instáveis: os homens se odeiam e odeiam homens que se amam; a terra reclama das desarmonias e vibra gerando tufões, terremotos, tsunamis, cataclismas; animais em simulação de cios arvoram civilização, bestificando homens; dogmas constroem cismas, traumas, contorcionismos criativos e criações; artes perfazem valores e à míngua nos imputamos prazeres performáticos de gozo; trotamos malabarismos de procriar e reivindicamos famílias a expor certidões de viver e morrer por causa de porras!
Só sabemos só saber e não sossobramos, é tão claro, meu amigo!
Doentes!
Mas meu compadre, Finado Túlio, que deus o tenho, pois o diabo jaz, já dizia: só o beijo resgata todo o infinito e o caos nos causa descansar em paz.

sábado, 26 de junho de 2010

Itinerário do Finado Túlio

Também sou um passageiro. O fato de cobrar a passagem não me faz imune aos efeitos dessa viagem insólita.
Não quer saber? Não sabe? Tenho também um amor. Ela veste-se de noiva, aproveita-se da ronda do por do sol, quando o vigia de lápides distrai-se do portão, e, finalmente, percorre o gramado lépida a chorar na noite arrodeando onde jaz meu corpo.
Nenhum outro passageiro apareceu e pareceu-me mais contente do que esse Finado Túlio. Não quis o troco, entretanto foi o único a usar o bagageiro, veio de mudança. De castigo, não sai desta condução e viaja em pé. Não descansa o pobre.
Eu me compadeço, pois geralmente me confundem com um anjo insensível, "somos passageiros", grito.
Túlio olha para mim com desdém, ele nunca acostumou-se com a viagem. Penso no olhar viscoso dos que vamos recolher pelas rodoviárias por aí. Penso neles como se as lágrimas de minha noiva gelatinassem.
Veja o senhor, uma autoridade de onde vem. Saiba que aqui, no "não-em" é só intervalo dos tempos, aí a lágrima jaz também apensa ao olho. Daí, sei que o senhor era autoridade de onde vem, mas no "não-em" não existe outro nem autoria. Então, sou tanto Mozart como Sócrates, nos olhos que me vêem e que posso ver.
Mas, vede o olhar do Finado Túlio: não trazem humidade. Há apenas um espírito irrequieto, empertigado por não aportar em seu destino e o tédio quando, no cemitério, acendem-lhe velas e trazem flores.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

poema outro apocalíptico

Havia ares de batalha nas penumbras amenas
Debaixo de sorrisos e solicitudes, uma chaga
Algum quê de pão de mel a boca quiucci
De cemitérios e rodoviárias convivas velavam!

São perigos iminentes os de um roto
A correr, vai-e-vem, estancam
Mais medo na alma, que "num punhado de pó"

E fomos colheita renhida no jardim de Deus
Quem dera nós, um dia, sem vestígios digitais

- Agora, eu era eu sou e você depois...!

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Ali a mesma Ismália a esmo

Aí, quando morrer, faço as malas
Sumo nas vozes ocas e olhos úmidos
Olhando tanto esse sol de meu Deus gritando...
De querer partir, de ficar em semente

Aí, morre o sol, à "flor do Chico, meio dia"
O maduro gosto de cores do menino-velho
Olhar o mar remove coisas semimortas
À pé na cova, à cor do ovo em pé

Até que nada mais deve restar do que as malas e o bilhete rosa
Rasgando o amarelo, o carregador de bagagens sela esconderijos
E todos os assentos abraçam as almas dos homens tortos e dos escritos

Em fim de itinerários em cujos cais abordam homens passageiros
Vejo tua morte minha, meu irmão, olho no olho aberto a fechar o sol
que mergulha enjembement nesse último verso metameudesespero

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Primeira plataforma

Seu olegário olhava, em redor, a movimentação das pessoas. Era um olhar viscoso, tanto pelos adjetivos quanto em substância. Havia fome também, mas acreditava que não adiantaria pedir ao homem da lanchonete um daqueles croquetes da bandeija lá perto da pia. Tinha lugar na estufa de salgados, então era de se concluir que os croquetes estariam vencidos. Além do mais, a fome ia-se indo, de dores em odores de estômago e das idas e vindas dos pedestres cheios de malas, mochilas, caixas e caixões.
Ele, um velho, sentado em uma das cadeiras azuis, com um olhar viscoso de fomes e olhares no vai-e-vem de transeuntes, trazia um saco onde já havia acondicionado a paçoca, a rapadura e um pedaço de fumo cheiroso. Não abria o saco. No entanto, o modo como o segurava era de se temer. Mesmo com o nó reforçado na boca, apertava gravemente e cheio de calos o seu único tesouro, o qual, de maneira alguma teria pensado em deixar para os seus parentes.
O asilo de onde acabara de fugir não era mais que o seu próprio barraco, construído por ele mesmo, um asilo voluntário, com hóspede único. Tinha cavado nos fundos do lote um poço que era bonito de se ver, e como dava água! O cachorro o abandonou quando do aparecimento das primeiras chagas, não antes de tê-las lambido em vão ofício de charlatão.
Dessa morada, vez em quando, o velho enxergava uma menina com corda e balde, a qual aparentava ir buscar água longe. E aqui mesmo, tão junto, não tinha água e boa? Mas seu Olegário também não chamava, que já perdia as vontades de voz.
Foi somente a desconfiança de chegada de um parente na colônia que movera o velho. Daí, as conduções vêm e vão, feito os passos dos viajantes, e nada do menino de que falaram suas premonições. Um menino, seu Olegário, tem o seu nome, sabia? Também não sabia se deixava com o menino os seus pertences, essas coisas são tão pessoais...
Parece que se ia amuando os zunidos das conduções e o burburinho das pessoas despedindo umas das outras, os beijinhos e choros de gente, tudo ia na malemolência de que o lugar estava para fechar. Olhou para estufa e não viu mais os salgadinhos nem o homem da lanchonete, mas os croquetes estavam ainda lá perto da pia, com uma boa leva moscas. Levantou o olhar viscoso e viu nuvens vermelhas de fazer gosto ao sol a se esconder lá no além. E lá divisava a menina com a corda, num nítido esforço de um balde transbordante, caminhando até os olhos do velho lacrimejarem ou um chamado tímido o despertar.
- Ei, Olegário, não é agora a nosso passeio?
Só era ele e o menino, então. E no olhar do menino tinha reconhecido o do cachorro fujão.
Sorriram.
Agora, com a bandeija de croquetes no chão e já nos olhos um jeito de festa, a ceia dele e do menino-cão era a desertar o lugar de pessoas e conduções.
- Guarde lugar na barriga para a rapadura. E amanhã ainda temos paçoca!
Já começava a mascar o fumo, e o cachorro abanava o rabinho e olhava em direção do sol vermelho, e compreendia que seu Olegário e ele tomariam a próxima condução, viesse ela quando viesse.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Santos puríssimos

...como a grana que todo mundo tem
Eu ando por aí nos bolsos; todo dia.

Dedico poemas debalde
Imprimo lombras adocicadas
Permito sedes em janelas
Leio poemas de insensatos
Cuspo sopas de letrinhas
Como nos pratos que como

Se eu não tivesse um delator à tiracolo não teríamos pietá
Roda gigante e girassóis protagonizam labirintite em sol

Quem irá se importar comigo?
Para nada serve o mundo que eu sei
mas, por que essa hora, essa aurora, essa porra!

todo dia, meu irmão!

Na multidão que eu atravesso que me atravessa através de si
Só vejo cadáveres, cada vez de ré, em revés de escada
nem compensam os meus trocadilhos, que dirá cacofonias!

Todo o santo dia, meu irmão!

Esse conhaque comovido que como me deixa o diabo...
Um teatro, se-não me engano, entradas francas
Ou todos Santos puríssimos sem mácula nem esmolas.

Todo o puto dia, meu santo irmão!

quinta-feira, 25 de março de 2010

O passo do condor

que cor tinham os céus quando você voava?
Sentinelas mostravam seus braços turvos
Sondavam sonhos brancos
Imunes aos senhores da mentira
(Marcelo Brice)

Na viagem de volta, uma paisagem nova, como a dizer que em todas as viagens fossem diferentes a ida e a volta. Menos de experiências que de sina, uma forma de aprender vôos em íngreme, pelas costas, o fazia carregar a invisível bagagem até o lugar estabelecido como casa. “É casa de morar pássaro”, de céu no alto, sobre pescoços calejados, presos por vontades de ver pássaros ao considerar as cores de pensamentos musicais, estes repousando febris no horizonte de testas, em uma madrugada buscada de longe em longe até o amanhecer.
Um pensamento sobre vôo, um absurdo: flores dissecadas na primavera. Mas o vôo vai, na tensão entre o existir e o que é agônico, na mera fábula do antigo e de novo, na amena antífrase do vero sim, feito nau. Crianças em fornos, sem hoje, sem sonos, sem nojo, sem remos. Há hesitação da metafísica que configura o real e o sonho, que acompanha as messes da vigília de dez mil gafanhotos aperfeiçoando o zen numa colheita sã.
Tristes, os déspotas digladiam no Eão. O que prende é o que eleva. A sutileza mais possível é a barbárie. Lixo é o que é necessidade. Nunca estar em si foi tão extasiar de momentos telúricos, dissimulando, assim, ilando tatos nas veias, crivando silêncios no ver.
Em pó, ramas da noite e do sol reinam sob subornos.
O tremer da segurança – terra à vista – mar à vista – martelos vis até o rio, até risar sobre vôo de dois pequenos gozos de viajar até o fim: nau de deus.
Lúgubre como a noite desvairada: o vôo vai, na agonia, desejando saber o universo, numa música que cintila nos ouvidos de ousados. Messes e seus hinos de plantar semente.
O pássaro voltou ao lar – mascarado e banido de si.
Convocou-se novamente a entidade fatídica do Eão, estancado e só em rimas, um nó de presença que prolifera na viagem do está lido, nas noções de pouso – na alegria que trafega do gozo, pelas muralhas de deuses que perfilam na primavera e no outono de Plutão e Perséfone, onde cada caboclo baforeja seus fumos enternecidos
E se garantem do verso, disperso na lisa, fina e adjetiva função – esvai, assim, a prosa cacófona –, que a história foi – não foi – não foi – foi – não foi. São meretrizes em plenas acro-bacias de amor-de-contos. Práticas de preencher papéis não meus – não meus – meus – não meus.
Há, porém, uma luva em cada esquina do esquife e segue-se o passeio em disfarces de mão, de faces em não, em face de não. Sem nãos, se fazem cavaleiros que até rimam ao até risar, é o léxico que perpendicula no romance de um ás sem dente. “Nada ter se hoje não ser sempre tudo”. Momentos de credo só se têm quando a fé falha, de sobrepujanças e preposições para fazer organizar a fala. Um manejo de sofrimentos alheios a perder de vista os males.
Ninguém entende as frases de um obtuso, mas a terceira mulher amada chegou à plenitude e gozou feito a eternidade, até que eterna se fez. Feiticeira fez de cera a terna garça do amor. Fez um fingimento capital, até que captou o canto profético. Como se todas as pitonisas prontificassem-se a Proust, astutas. “Há uma santa [puta] com ou sem nome” a dar mais homens salvos que o deus que a salva. Uma rainha tola de débeis inspirações criadoras: Diana – deusa feliz! Quem disse que ser mulher é ser bastante a falta?
Um conto, com respeito e murmúrio, no ouvido, a falar sapiências, ouve comedido, como se com o mênstruo possuísse a maior fé.
São tantas fases de acasalar, que se coubessem como profanação de livros ufanos, sem palavras, não mais que a carne dura em lábio feito anel, quem sabe a orbe desejaria, autorizaria, com langor, unir um em outro.
O manto de cobre é um núncio andrajo, sórdido, no qual o sangue corre, fermentado de doce volúpia, hoje, de deusa, que devota para jamais adorar multidões, tremendo.
Que homem dirá que ascende para um pó de um mais doce e sem fim?
O enfado humano prende a Terra por sentir que já não escapa mais da dor sem amor, afora a bebida que rende a viagem sem rumo. Tolices e perseguições se sucedem sem súditos, sem a revolução nem o caos do amor tenso.
Sem sorrisos, cegos, ora nos aromas, ora nos calos das patas, trafegam seus passos sonsos, no olhar do tolo, até que o enfado, que lhes prende à Terra, causar-lhes dó.
– Se a cor do meu caos não for qual meu fardo, que é meu, não for igual a dor que me acometeu, então não me darei a mim o que não for me dado, como se o que faltasse a mim, falte-me, assim, por meu bel prazer, num sobressalto, num sobrevôo último e certeiro.
Na volta dessa viagem, seu vôo de pássaro vai, como em uma telegrafia de mensagens turbulentas. Como todos os repiques de tambores, nos ritmos quebradiços dos nós das almas, nos seus elos cauterizados de nuvens, vulcões e raios.
E ainda, sob o pôr mais caótico do sol, é permitido destilar somente uma lágrima. Naquela meia esfera, meio ex-fera, esvai-se, num vacilante pulo; e é quando perco sua morte minha, minha vida sua, meu irmão.