quinta-feira, 29 de abril de 2010

poema outro apocalíptico

Havia ares de batalha nas penumbras amenas
Debaixo de sorrisos e solicitudes, uma chaga
Algum quê de pão de mel a boca quiucci
De cemitérios e rodoviárias convivas velavam!

São perigos iminentes os de um roto
A correr, vai-e-vem, estancam
Mais medo na alma, que "num punhado de pó"

E fomos colheita renhida no jardim de Deus
Quem dera nós, um dia, sem vestígios digitais

- Agora, eu era eu sou e você depois...!

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Ali a mesma Ismália a esmo

Aí, quando morrer, faço as malas
Sumo nas vozes ocas e olhos úmidos
Olhando tanto esse sol de meu Deus gritando...
De querer partir, de ficar em semente

Aí, morre o sol, à "flor do Chico, meio dia"
O maduro gosto de cores do menino-velho
Olhar o mar remove coisas semimortas
À pé na cova, à cor do ovo em pé

Até que nada mais deve restar do que as malas e o bilhete rosa
Rasgando o amarelo, o carregador de bagagens sela esconderijos
E todos os assentos abraçam as almas dos homens tortos e dos escritos

Em fim de itinerários em cujos cais abordam homens passageiros
Vejo tua morte minha, meu irmão, olho no olho aberto a fechar o sol
que mergulha enjembement nesse último verso metameudesespero

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Primeira plataforma

Seu olegário olhava, em redor, a movimentação das pessoas. Era um olhar viscoso, tanto pelos adjetivos quanto em substância. Havia fome também, mas acreditava que não adiantaria pedir ao homem da lanchonete um daqueles croquetes da bandeija lá perto da pia. Tinha lugar na estufa de salgados, então era de se concluir que os croquetes estariam vencidos. Além do mais, a fome ia-se indo, de dores em odores de estômago e das idas e vindas dos pedestres cheios de malas, mochilas, caixas e caixões.
Ele, um velho, sentado em uma das cadeiras azuis, com um olhar viscoso de fomes e olhares no vai-e-vem de transeuntes, trazia um saco onde já havia acondicionado a paçoca, a rapadura e um pedaço de fumo cheiroso. Não abria o saco. No entanto, o modo como o segurava era de se temer. Mesmo com o nó reforçado na boca, apertava gravemente e cheio de calos o seu único tesouro, o qual, de maneira alguma teria pensado em deixar para os seus parentes.
O asilo de onde acabara de fugir não era mais que o seu próprio barraco, construído por ele mesmo, um asilo voluntário, com hóspede único. Tinha cavado nos fundos do lote um poço que era bonito de se ver, e como dava água! O cachorro o abandonou quando do aparecimento das primeiras chagas, não antes de tê-las lambido em vão ofício de charlatão.
Dessa morada, vez em quando, o velho enxergava uma menina com corda e balde, a qual aparentava ir buscar água longe. E aqui mesmo, tão junto, não tinha água e boa? Mas seu Olegário também não chamava, que já perdia as vontades de voz.
Foi somente a desconfiança de chegada de um parente na colônia que movera o velho. Daí, as conduções vêm e vão, feito os passos dos viajantes, e nada do menino de que falaram suas premonições. Um menino, seu Olegário, tem o seu nome, sabia? Também não sabia se deixava com o menino os seus pertences, essas coisas são tão pessoais...
Parece que se ia amuando os zunidos das conduções e o burburinho das pessoas despedindo umas das outras, os beijinhos e choros de gente, tudo ia na malemolência de que o lugar estava para fechar. Olhou para estufa e não viu mais os salgadinhos nem o homem da lanchonete, mas os croquetes estavam ainda lá perto da pia, com uma boa leva moscas. Levantou o olhar viscoso e viu nuvens vermelhas de fazer gosto ao sol a se esconder lá no além. E lá divisava a menina com a corda, num nítido esforço de um balde transbordante, caminhando até os olhos do velho lacrimejarem ou um chamado tímido o despertar.
- Ei, Olegário, não é agora a nosso passeio?
Só era ele e o menino, então. E no olhar do menino tinha reconhecido o do cachorro fujão.
Sorriram.
Agora, com a bandeija de croquetes no chão e já nos olhos um jeito de festa, a ceia dele e do menino-cão era a desertar o lugar de pessoas e conduções.
- Guarde lugar na barriga para a rapadura. E amanhã ainda temos paçoca!
Já começava a mascar o fumo, e o cachorro abanava o rabinho e olhava em direção do sol vermelho, e compreendia que seu Olegário e ele tomariam a próxima condução, viesse ela quando viesse.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Santos puríssimos

...como a grana que todo mundo tem
Eu ando por aí nos bolsos; todo dia.

Dedico poemas debalde
Imprimo lombras adocicadas
Permito sedes em janelas
Leio poemas de insensatos
Cuspo sopas de letrinhas
Como nos pratos que como

Se eu não tivesse um delator à tiracolo não teríamos pietá
Roda gigante e girassóis protagonizam labirintite em sol

Quem irá se importar comigo?
Para nada serve o mundo que eu sei
mas, por que essa hora, essa aurora, essa porra!

todo dia, meu irmão!

Na multidão que eu atravesso que me atravessa através de si
Só vejo cadáveres, cada vez de ré, em revés de escada
nem compensam os meus trocadilhos, que dirá cacofonias!

Todo o santo dia, meu irmão!

Esse conhaque comovido que como me deixa o diabo...
Um teatro, se-não me engano, entradas francas
Ou todos Santos puríssimos sem mácula nem esmolas.

Todo o puto dia, meu santo irmão!