sábado, 26 de junho de 2010

Itinerário do Finado Túlio

Também sou um passageiro. O fato de cobrar a passagem não me faz imune aos efeitos dessa viagem insólita.
Não quer saber? Não sabe? Tenho também um amor. Ela veste-se de noiva, aproveita-se da ronda do por do sol, quando o vigia de lápides distrai-se do portão, e, finalmente, percorre o gramado lépida a chorar na noite arrodeando onde jaz meu corpo.
Nenhum outro passageiro apareceu e pareceu-me mais contente do que esse Finado Túlio. Não quis o troco, entretanto foi o único a usar o bagageiro, veio de mudança. De castigo, não sai desta condução e viaja em pé. Não descansa o pobre.
Eu me compadeço, pois geralmente me confundem com um anjo insensível, "somos passageiros", grito.
Túlio olha para mim com desdém, ele nunca acostumou-se com a viagem. Penso no olhar viscoso dos que vamos recolher pelas rodoviárias por aí. Penso neles como se as lágrimas de minha noiva gelatinassem.
Veja o senhor, uma autoridade de onde vem. Saiba que aqui, no "não-em" é só intervalo dos tempos, aí a lágrima jaz também apensa ao olho. Daí, sei que o senhor era autoridade de onde vem, mas no "não-em" não existe outro nem autoria. Então, sou tanto Mozart como Sócrates, nos olhos que me vêem e que posso ver.
Mas, vede o olhar do Finado Túlio: não trazem humidade. Há apenas um espírito irrequieto, empertigado por não aportar em seu destino e o tédio quando, no cemitério, acendem-lhe velas e trazem flores.